domingo, 22 de dezembro de 2019

Um perigo chamado carência

Depois de estar solteira por tantos anos, chegamos àquela encruzilhada entre o não conseguir se envolver com tanta facilidade e o acabar se envolvendo com qualquer um por pura carência. Já até escrevi aqui sobre o desafio de não ficar totalmente cética, mas também não forçar a barra só para não ficar sozinha.

Tem dias que é super fácil ser a sensata da vida e agir com maturidade, mas de tempos em tempos, a dona carência chega a um nível perigoso onde a gente corre sérios riscos de ignorar sinais importantíssimos em nome de viver um romancezinho sequer, nem que seja só para tirar a poeira do coração.

Foi aí que eu reencontrei um rapaz que havia sido apaixonado por mim na época da escola e quase troquei os pés pelas mãos. Todo aquele frisson de adolescente de alguma forma reapareceu dentro de nós e de repente estávamos nos falando todos os dias. Eu, solteira há mais de 6 anos, sem filhos. Ele, recém-separado de um relacionamento de 8 anos com uma mulher sabidamente instável e que não aceita o fim do casamento, com o adicional de 3 filhos. Parecia que a novela mexicana já estava escrita, e mesmo lendo o script antes de beijá-lo, eu acabei caindo nessa furada.

Por que será que carência deixa a gente cego tal qual quando estamos apaixonados por alguém? Por que a gente começa a relativizar tudo e relevar algumas coisas importantes, ouvindo seu cérebro dizer "ah, mas ele te trata tão bem, ele foi tão apaixonado por você, ele é uma pessoa tão bacana!"?

The thing is: não é sobre ser ou não ser bom. É sobre não ser bom para você. E pronto.

Ficar com um cara numa vibe super nostálgica e romântica e no outro dia ser bombardeada pela ex do cara (que tem todas as senhas das redes sociais dele - e eu nunca vou entender essa falta de privacidade que certos casais confundem com confiança!) é puro sinal de que é uma cilada, Bino. Por mais que saibamos da instabilidade emocional da moça (o que, acreditem, para mim é bem difícil de concordar, como feminista que sou), até onde o que ela diz é mentira? E mais, até onde o que ela diz vai passar reto e não te afetar em nada? Sou assim tão evoluída?

A verdade é que a mulher já foi denunciada por ameaçar a última tentativa de romance do ex-marido de morte e inclusive condenada a pagar indenização e prestar serviços comunitários. Ela jogou roupas e livros dele fora. Ela furou os 4 pneus de seu carro e jogou xixi nos bancos. Ela usa os filhos como forma de ameaçá-lo. E toda vez que ele chega perto de mim, ela descobre e me manda mensagem inventando alguma coisa para que eu desconfie de que tudo o que ele fala e faz é mentira.

Onde vou parar me envolvendo em uma história tão maluca, sendo enroscada em uma relação tão tóxica? Serei eu envenenada também?

E foi aí que o lado racional do meu cérebro começou a berrar, porque não importa que ele me trate como uma rainha, me faça sentir desejada, admirada ou passível de ser amada. Essa confusão é grande demais pelos poucos benefícios recebidos.

Eu mereço sim tudo isso que ele estava me fazendo sentir, mas como diria Cazuza, eu quero a sorte de um amor tranquilo. Sentir tudo isso e no dia seguinte sentir uma tensão absurda, um medo de estar sendo vigiada a cada passo e pavor de a qualquer momento sofrer alguma tipo de agressão física ou psicológica faz esse lance perder todo o valor.

Eu sinto que está na hora de meu coração voltar a ter mais do que apenas a função de bombear sangue, mas quando isso acontecer, vai ser com alguém que me faça sentir segura o tempo todo e não apenas enquanto está fisicamente na minha presença. Valeu a tentativa, universo, mas eu quero (e mereço!) muito melhor que isso.